Dona Neide
- André Luis Mazzoli
- 18 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Quando vi que Darren Aronofsky estava dirigindo um filme chamado "Mãe!" fui do curioso entusiasta ao receoso. Passei por algumas experiências contestáveis com ele. Por vezes, em "Cisne Negro", eu olhava pras outras pessoas que assistiam ao filme comigo pra saber se era coisa da minha cabeça, ou se todos estavam tendo o mesmo pressentimento.
Já em "Noé" ele incita os mais religiosos. É óbvio que Aronofsky não estava pensando na forma como as pessoas interpretariam este roteiro adaptado. Pode ser especulado da motivação de provocação ou simplesmente pelo dinheiro. Contudo, é bastante controverso visto que agradou a crítica, mas não ao público, como mostra o Rotten Tomatoes.
Admito que demorei pra perceber o que Daren estava tentando dizer com aquele roteiro e aquela direção em "Mãe!". É pouca conversa e muita simbologia te espancando a cara. Todavia, quando começamos a perceber as referências, ao mesmo tempo em que tudo se tornou muito satisfatório, foi bastante hostil. Quase quebrando a quarta parede e nos entregando suas simbologias em mãos. Quando o filme terminou eu estava destruído, desolado e constrangido. Ou seja, eu soube separar suas alusões e não me senti ofendido, tampouco em minha crença. "Para mim" "Mãe!" é um filme ma-ra-vi-lho-so. Encontrei-me boquiaberto até mesmo nos seus créditos (sejam observadores). Consegui então fazer a fugaz paz com o diretor. E quando terminou pensei muito em Deus. Mas lembrei-me muito da minha mãe. O título já te chama a isso. É o que acontece quando digo pra que não pense em um elefante vermelho (E ai? em que pensou?). Não é o foco, mas, o filme deixa bem nítido a inesgotável capacidade de uma mãe em proteger seu filho.
Lembro-me de poucas coisas da minha infância. Meu cérebro é bastante seletivo. Mas guardo recordações bem nostálgicas de épocas que, talvez, nem sei ao certo porque me recordo.
As mais antigas lembranças que eu tenho de minha mãe, ela não estava presente. Pois quando eu levantava pra ir à escola, ela estava dormindo. E, como estudava em período integral, quando eu voltava, ela já havia saído pra trabalhar. E passava a noite inteira fora. E quando fui pra Jundiaí, demorava muito tempo pra encontrá-la novamente. Era uma época de construção de personalidade carregada em sentimentos conflitantes de vazio e saudade.
A partir do momento que novamente estivemos juntos, tive uma criação onde, por parte da minha mãe, não havia distinção entre garotos e garotas sobre deveres e direitos. Nós fazíamos as coisas dentro de casa. Mas minha mãe nunca nos disse se algo estava errado ou não. Ou seja, crescemos como Vikings. Só descobri que roupas coloridas não poderiam ser lavadas com roupas brancas quando fui morar sozinho. E descobri na prática e da pior forma (constatei o que havia aprendido nas aulas de artes no primário: branco com vermelho realmente dá rosa).
Minha mãe sempre foi oito ou 80, ou talvez 800. Ou ela esbravejava demais, tanto para as grandes, como para as pequenas coisas, ou amava demais. Contudo, hoje, como pai, sei que os dias de fúria também são pra colocar nosso amor em prova. Eu esperava pelo dia em que ela Invadiria o Jornal Nacional, chutaria o Willian Bonner pro lado, para expor, em rede nacional, minhas notas boas na escola. Contudo, quando éramos pra levar bronca ou surra, havaíanas não respeitavam qualquer tipo de lei da física. Elas dobravam esquinas como bumerangues. Mas sou sincero em admitir que das vezes que apanhei realmente mereci (já não posso responder por meus irmãos).
Depois que completei a maioridade, minha mãe adotou uma nova forma de atuação. Eu já era adulto e ela respeitava minhas opiniões e meus gostos (desde minhas tatuagens às saideiras). Todavia, acredito que desde a morte do meu padrasto ela busca por uma nova voz masculina dentro da vida dela. E então aceita facilmente o que eu e meu irmão dizemos, e adota como verdade. Mesmo que seja uma opinião ruim. Quando preciso de socorro financeiro ela me acode, ou quando preciso de uma palavra amiga, ela escolhe as afetuosas. Até mesmo quando estou errado. Hoje moramos longe. Mas nem que seja o pedido de uma benção, nos falamos todos os dias.
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