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A oportunidade de ser outro alguém

  • Foto do escritor: André Luis Mazzoli
    André Luis Mazzoli
  • 18 de jul. de 2020
  • 3 min de leitura

Quando eu era pequeno via nos filmes e séries, crianças correndo de porta em porta: Doces ou travessuras! Eu nunca sabia o que eram as travessuras. Tampouco me importava com os doces. Estava mais contemplativo às fantasias. E pensando: Enquanto lá nos Estados Unidos eles têm o Halloween, nós aqui temos o folclore e Cosme e Damião. Caramba, eu queria também poder fazer fantasias pra num determinado dia do ano andar pelas ruas sem ser chamado de louco. Minha infância acabou, isso nunca aconteceu e hoje as pessoas pensam que sou louco. Deveria ter andado pelas ruas fantasiado.

Em 1999, houve uma gincana na escola. Na época eu estava na terceira série, e no fim do ano me formaria. E pensei então: Foda-se se vamos passar vergonha. Nós faremos uma equipe, e não vamos apenas participar dessa gincana. Nós vamos ganhá-la. A gincana veio com um estatuto cheio de diretrizes. Tinha um número certo de participantes. Nem mais, nem menos. E como eu não era uma personalidade escolar estimada pelo povo, tive que suplicar e fazer algumas barganhas para algumas pessoas fazerem parte da equipe. O nome da equipe era Atecubanos (não entendeu o que significa? Leia de trás pra frente.). Quase levamos uma advertência por colocar aquele nome na equipe. Mas, depois que as camisas já haviam sido confeccionadas não tinha mais como mudar. Lembro-me de sentir um anarquista quando entramos na escola com aquela camisa. Foram duas semanas de disputa e a equipe campeã iria passar um final de semana num hotel fazenda. Fomos muito guerreiros. Mas infelizmente ficamos em quinto lugar. Logo atrás das outras quatro únicas equipes participantes.

Não saímos vitoriosos. Na verdade passamos bem longe. E naquele momento, a pouca credibilidade que ainda tínhamos na escola estava num cânion cheio de gelo com quilômetros de profundidade abaixo do nível do mar. Mas algo nos rendeu. O clube dos perdedores estava mais unido. E concedemo-nos um prêmio de participação. Uma festa à fantasia. Estava super empolgado. Alugamos um salão em Taguatinga que cabia vinte vezes mais gente do que éramos lá. Minha mãe havia feito à fantasia do Reptile do Mortal Kombat. E confesso que ficou bem legal. Assumo também que achei que antes da carruagem virar abóbora já estaríamos cansados. Mas dançamos e bebemos até às 6hrs da manhã.

Os anos foram passando, e vieram outras festas à fantasia. Já me trajei de diabo (não do vermelhão com rabo. Mas com terno gravata e chifre), Jason, Charada, V (V de vingança). E lembrando isso, fiquei absorto em uma ideia: Eu sempre optei pelos vilões. E é óbvio que não foi por falta de opção. Pois pra cada vilão, sempre houve um herói. E eu nunca priorizei o herói. Faço aqueles testes idiotas de internet: descobrir qual personagem você é. Algumas vezes há um bug no sistema do quiz e me dão o mocinho, como o Jake Peralta de Brooklyn 99. Mas, particularmente, fico mais satisfeito quando me entregam o vilão. Não porque eu goste de ser mal. Mas porque acredito que condiga mais com meu jeito de pensar e agir. Consigo concebê-los mais como humanos que os heróis.

Às vezes vivemos tão absortos na vida real preocupados com casa, família, carro, trabalho, boletos (...) que precisamos sair um pouco de quem nós somos e tentar viver outras aventuras e devaneios. Nessas horas penso que se Morpheus chegasse me dizendo “Se tomar a pílula azul… a história acaba, e você acordará na sua cama acreditando… no que quiser acreditar.". Ótimo Morpheus, nem precisa me dizer o que faz a pilula vermelha. tchau! Estou entrando na minha linha 4.0. E confesso que gostaria de uma última festa à fantasia antes de só poder me vestir de Eustácio do desenho do Coragem o cão covarde.

 
 
 

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