2 Coríntios 4:16-18
- André Luis Mazzoli
- 16 de jul. de 2020
- 5 min de leitura
Eu nasci em família Cristã. O lado do meu pai era Espírita seguidores das codificações de Allan Kardec. O lado da minha mãe dependia muito de com quem minha avó estava casada. Quando ela estava matrimoniada com meu avô, eram católicos. Até onde sei não eram praticantes. Quando ela se casou com o padrasto da minha mãe, a casa se converteu as doutrinas evangélicas. Ou pelo menos era o que eles transmitiam. Mas tanto eu como minha irmã éramos batizados.
Meus avós ou meu pai nunca tentaram impor uma crença pra mim. Eles me davam liberdade para escolher o que achava ser mais sensato. Mas naquela época, com apenas nove anos, sensatez era decidir se iria assistir Thundercats na Globo ou Ducktales no SBT. Havia uma vizinha da casa da minha avó que era muito católica. Ela me levou à catequese. Não houve imposição por parte dela, nem obstáculos por parte de meus avós. E eu fui por simples curiosidade. Afinal de contas eu nunca havia tido uma crença. Sabia da existência de um Deus e era temeroso a Ele. E também porque eu não saia de casa pra nada. Era outra oportunidade, além da escola, de confraternizar com outras pessoas da minha idade.
Houve um domingo que fui à missa e houve uma casualidade. Um dos coroinhas faltou. E uma catequista me colocou no lugar. Contudo, eu cargas d'água não sabia bulhufas do que deveria fazer. E ela maliciosamente disse-me que seria super fácil e que eu iria tirar de letra. Quando a missa começou, eu já me sentia acometido pela síndrome do desastre. Não bastava apenas não saber o que fazer, mas derrubar o ostensório na frente do padre, da comunidade e de Jesus na Cruz... Ás vezes acho que a Lei de Murphy e a perversidade do Universo foram baseadas na minha vida. Aquilo foi o suficiente pra eu não voltar à catequese. Além, claro, de não gostar de levar réguadas gratuitamente da minha catequista.
Quando fui pra Brasília me deparei com uma situação de engraçada à inusitada. Meus primos eram católicos, meu tio era católico, o clube dos perdedores era católico, minha casa era católica. As pessoas me olhavam como se eu fosse um adorador de satanás que sacrificava virgens dentro de um pentagrama. Foi então que, mais uma vez, me inscrevi na catequese. Mas dessa vez minha catequista parecia o professor de geopolítica de Ferris Bueller (os bons entendedores entenderão). Dificilmente conseguia ficar um encontro inteiro. Foi quando depois de um mês eu já havia desistido novamente.
Passei a adolescência sem uma crença. Mas, frequentava as missas esporadicamente. Sabia as orações, o nome de alguns santos, os cânticos, ajoelhava quando preciso e não dormia na homília (E quando o padre é espanhol, não fala bem nosso idioma e sistema de som da igreja é uma verdadeira merda, não dormir na homilia era um ato homérico). Tive uma colega de trabalho,
catolicíssima, que uma vez me disse que, por eu ser kardecista, não era bem vindo à igreja dela. E eu me senti super-desinformado, pois o céu entrou em concordata, foi penhorado, comprado por ela e eu sequer fiquei sabendo. Fico imaginando Jesus Cristo trabalhando vinculado à CLT.
Quando adulto, numa ocasião em que minha mãe havia se convertido abertamente ao espiritismo, passei a ler os livros de Chico Xavier, Elisa Masselli, Mônica de Castro e Zibia Gasparetto. Na minha cabeça, o fato de ler livros sobre espiritismo me fazia Espírita. Não frequentava nenhum centro, ou sessões médiuns, não recebi nenhuma entidade pra fingir poder fazer cirurgias para estuprá-las, tampouco cortava cabeças de galinhas. Mas fantasiava ter um dogma. E fiquei neste senso durante muito tempo. Houve uma entrevista de emprego (que eu estava muitíssimo confiante. Tanto porque parecia que a entrevista se desenvolvia muito bem) em que a funcionária do RH me perguntou minha religião. Quando eu disse que era espírita, o que parecia uma conversa aprazível e cortês tornou-se algo do tipo "a gente te liga!". Poxa, será que eu deveria ter dito que não acendia vela roxa, com galinha preta na encruzilhada? Óbvio que as pessoas perguntavam isso para não contratarem adventistas do sétimo dia. Mas depois disso passei a adotar a resposta "Sou Cristão".
Até que um dia, nós passávamos a Páscoa na casa de uma amiga em Brasília, quando a Alice, bem pequenina, explicou não somente às crianças que estavam próximas a ela, mas, gosto de pensar, que principalmente pra mim, o sentido da Páscoa. Que os chocolates e o coelho eram apenas símbolos capitalistas para vender mais (ela não disse com essas palavras, claro!). Mas sim Jesus Cristo. E nesse momento o Espírito Santo baixou sobre mim, colocou a mão sobre meu ombro e com uma voz melódica soprou no meu ouvido: Acorda otário! Eu entendi que eu estava perdido. E que por mais que saísse pisando por entre as religiões, ou por fora delas, não havia outro lugar que não fosse meu senão o catolicismo.
Quando voltei à Caldas Novas procurei a catequese e comecei a Crisma para adultos. Recebi o sacramento como se tivesse me graduado em doutorado em astrofísica nuclear e estivesse pronto pra trabalhar na NASA. Fico orgulhoso de ter a percepção de que o Sacramento é apenas o começo. Muita gente saí da catequese pensando que somente indo à missa é suficiente (Mas, Hey, você que pensa dessa forma, seu saco de vacilo; você sabe que precisa fazer algo mais, e não faz por que mesmo?). Assim que recebi o sacramento passei a fazer parte da Pastoral do Turismo. Era um grupo bem pequeno. E eu nem sentia que estávamos atingindo nossas metas como eu queria. Mas primeiramente, eu não estava parado; e segundo, o que importa não era o que eu queria.
Não demorou muito tempo para que uma amiga freira viesse falar comigo com o argumento de que eu tinha o dom da palavra e que a catequese precisava de mim.
Na época, eu estava ainda na Pastoral do turismo e trabalhando. E ser catequista não é apenas você ter o dom da palavra entrar numa sala e começar a falar. É preciso preparação e o máximo domínio possível do que está falando. Os encontros eram uma vez por semana. Mas eu não poderia me comprometer com mais uma responsabilidade na Igreja se não fosse resoluto. A Pastoral do turismo eram algumas cabeças pensantes. Na catequese seria apenas eu numa sala com adolescentes precisando ser convictos de que Deus é o caminho, a verdade e a vida. Ou seja, os novos católicos estavam lá para ouvir-me falar. Nisso, fui incisivo em dizer "não". E continuei apenas na Pastoral do turismo.
As tentativas de me colocar dentro continuaram. Cientes da minha doença e, se preciso, mesmo que remanejasse alguém pra me encaixar no quadro. Eu relutei bastante, mas acabei aceitando. E como previsto, tive que abandonar a Pastoral do turismo. Contudo, reivindiquei a turma da Crisma, pois tinha mais facilidade pra falar com os adolescentes. Eu já participava bastante das missas, e agora se intensificou. Não ia mais à missa apenas porque era uma incumbência pessoal. Mas porque agora eu também era modelo.
Hoje, enquanto falo com vocês, estou na minha quinta turma, frequento as missas todos os finais de semana, e por vezes até em dias semanais, rezo meu terço, assisto palestras e homílias, como meus favoritos Padres Leo e Chrystian Shankar, tenho minha playlist gospel no carro, sou devoto dos meus santos, não há um cômodo em casa que não haja algo religioso, assim como em meu guarda roupas, e leio. Afinal de contas. Se alguma pessoa, que não faço ideia de quem seja se dá ao trabalho de pintar placas e pregá-las, no meio do nada, dizendo "Leia a Bíblia", é porque algo de muito importante deve estar escrito lá. Não somente pra mim, mas pra você, que está lendo este relato nesse exato momento e se identificando.
Deus acredita em você... Eu acredito em você... seja você e deixe Deus agir!